As baixas temperaturas combinadas com o início do período de seca vêm prejudicando a cultura hortifrúti, especialmente as lavouras de milho e soja, o que poderá implicar em custos mais altos para produtores e menor investimento em segmentos específicos, como a cadeia de derivados do leite.
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De acordo com Matheus Peçanha, economista e pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV-IBRE), o aumento nos preços de hortifrútis, esperado por conta dos efeitos da geadas nas lavouras previstas para os próximos dias, representa mais uma onda de choques de oferta. Algo que deve intensificar o agravamento de custos de mais longo prazo para produtores.
Esses produtos têm uma demanda muito inelástica, já que é pouca a substituição possível entre eles. Estamos falando de um problema de oferta que vai gerar um aumento de preço num setor que já está bem estrangulado por conta de sucessivos choques de oferta e por causa do clima, e agora também por conta de outros custos acessórios, como os do diesel e dos fertilizantes, afirma Peçanha.
Os choques de oferta motivados por eventos climáticos são por definição passageiros, mas têm um efeito cumulativo, segundo o especialista.
A perspectiva é que os preços se normalizem após o impacto. Estamos observando, contudo, uma soma de choques, que é algo raro de acontecer, mas que está se transformando em uma tempestade perfeita. Vimos as consequências da seca em 2020, que foi seguida de geadas e chuvas torrenciais em 2021, e por conta do conflito militar agora temos o agravante de custos mais altos de longo prazo, que demoram mais para disseminar na cadeia, explica.
O economista afirma ainda que a estabilização dos preços irá depender das safras a partir da primavera. Ainda que a alta nos preços dos combustíveis e fertilizantes estejam no radar, são problemas de mais longo prazo, que levam mais tempo para serem incorporados na cadeia de produção. O principal mesmo é a condição de curto prazo que depende do clima, comenta.
Resposta da cadeia
Se o cenário de geada afetar as lavouras de milho safrinha, a tendência é que o impacto seja negativo na pecuária de leite por conta do aumento de custo, segundo o pesquisador Glauco Carvalho, da Embrapa Gado de Leite. Caso a geada venha a prejudicar a qualidade das pastagens, a situação só tenderia a agravar no âmbito da oferta de leite, pois afetaria a alimentação dos animais em pastejo. Dessa forma, com um cenário de geada mais severo, a tendência que vemos é de a oferta seguir apertada, observa.
Carvalho explica que o cenário de menor oferta acaba colocando um piso nos preços ou aumentando a cotação ao produtor. Ou seja, há o estímulo de preços. Hoje o desinvestimento tem ocorrido por aperto de margens e necessidade de investimento em tecnologias e escala de produção. O leite tem exigido mais capital do que exigia no passado, comenta.
Ao avaliar o impacto do aumento de custos para a nutrição do gado leiteiro, um dos principais gastos do produtor, a pesquisadora Natália Grigol, do Cepea (Centro de Pesquisa em Economia Aplicada) da Esalq (Escola Superior de Agronomia Luiz de Queiroz), destaca a queda nas margens e obstáculos para os investimentos. Houve alta nos preços dos adubos e corretivos, nos suplementos minerais e também nos grãos concentrados, o que tem corroído as margens do pecuarista e impedido investimentos na atividade. Com isso, vemos o potencial produtivo e a oferta ficando mais limitados neste ano. A produção de leite no campo tem ficado mais enxuta, e por isso mais cara. Como consequência, toda a produção dos lácteos também tem se encarecido. A alta no patamar de preços não significou lucratividade nem para o produtor nem para o laticínio, mas uma resposta da cadeia que está sofrendo com o aumento nos custos de produção, explica Natália.