O Pacto Verde Europeu: o que você precisa saber

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Artigo de André Ricardo Passos de Souza, Professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e sócio-fundador do Passos e Sticca Advogados Associados (PSAA)

Em recente pronunciamento na reunião dos BRICS, o Presidente da República Federativa do Brasil abordou o tema do Green Deal, ou Pacto Verde Europeu, afirmando que: “Não podemos aceitar um neocolonialismo verde que impõe barreiras comerciais e medidas discriminatórias sob pretexto de proteger o meio ambiente”.

Foto: PSAA – Divulgação

Aqui vale um parêntese para explicar ao leitor do Agroclima:

O Pacto Verde Europeu, em verdade, representa uma série de exigências, medidas e regulamentos editados pelos países da União Europeia (UE) e no âmbito da governança da própria UE no sentido de restringir a entrada em países europeus de produtos, basicamente commodities do agronegócio, como cacau, café, carne, soja dentre outros, produzidos em áreas que estejam em desconformidade com a legislação ambiental europeia e a legislação ambiental dos países em que sejam produzidos para exportação a países europeus. Tudo para que a UE cumpra, até 2050, com uma meta de redução de até 55% (cinquenta e cinco por cento) das emissões de GEEs – Gases de Efeito Estufa em comparação com os níveis de emissão de 1.990.

Claro que o Brasil, maior produtor mundial de vários desses produtos agropecuários, e também os produtores rurais brasileiros, por via de consequência, entram na “mira” dessa legislação que, em verdade, como acabou pontuando o presidente da república, visa criar restrições comerciais para alguns produtos de origem agropecuária com base em supostas desconformidades de produção que, por vezes, abrangem até ações legais e autorizadas pela legislação ambiental dos países de origem dos produtos abrangidos para a produção rural em total conformidade com a legislação ambiental e florestal de muitos desses países.

Importante dizer ainda que para o agronegócio brasileiro é muito relevante a questão já que estamos falando de um mercado, a UE, que é destino de cerca de 20% (vinte por cento) do total das exportações de produtos agropecuários brasileiros.

Foto: Getty images

Isso porque, conforme apurado nos últimos levantamentos oficiais, tal normativa que entrará em pleno vigor a partir do ano de 2024, indica que para que os produtos agropecuários continuem a ser vendidos (e exportados) aos países da UE após a entrada em vigor desse “pacote de medidas”, deverão ser produzidos em áreas com desmatamento zero (mesmo quando autorizado e legal nos países produtores que produzem dentro de padrões governança ambiental séria e com licenças etc.).

Além disso, o que por si só já representa um desafio para quem produz e atende às normas ambientais nas várias esferas da federação, as diretivas indicam restrições para alguns defensivos agrícolas, com redução na utilização de fertilizantes com maior fixação de nutrientes, redução de antimicrobianos na pecuária, além de considerar as emissões de metano pela pecuária – o que já tem sido feito em larga escala no país -, até mesmo com a possibilidade de serem sobretaxados por suposto “vazamento de carbono”.

É dizer que, apesar da exigência europeia para cumprimento de normas que venham a cobrar a conformidade ambiental de produtores, importadores e exportadores de produtos agropecuários, em tese, ser mais do que bem-vinda, principalmente num contexto internacional em que as mudanças climáticas podem ser tratadas como “fato” decorrente de consenso científico mundial, a “abertura” demasiada da normativa conforme as diretivas acima combinada com a o efeito de “extraterritorialidade” nela pode vir a criar situações para lá de inusitadas em vários países produtores como, por exemplo, para produtores do Brasil, e assim, prejudicar a produção e o fornecimento de alimentos, fibras e energia renovável para o mundo redundando, ao fim e ao cabo, em maior e não menor “pegada de carbono” nas cadeias globais de produção desses produtos.

Podemos afirmar a partir desta constatação que potencialmente pequenos produtores que, apesar de cumpridores da legislação ambiental local e em conformidade com as melhores práticas de produção em seus respectivos países, poderão ter de deixar de colocar os seus produtos no mercado regularmente após 2024 já que, em tese, estariam descumprindo (e sem saber!) a normativa europeia, impactando sobremaneira a oferta e produção de alimentos, fibras e energia renovável em um mundo cada vez mais necessitado desses produtos feitos com o maior rigor e respeito às leis ambientais. No jargão popular, “o tiro pode sair pela culatra” e gerar um efeito contrário no mundo como um todo em contraposição a um suposto efeito benéfico na Europa.

É notável que com o advento do Pacto Verde Europeu estamos diante de novos parâmetros de mercado e, portanto, de novos tempos para o comércio internacional e para as cadeias globais de muitos dos produtos agropecuários largamente produzidos e comercializados no mundo, mas que, certamente, tais normativas podem e devem encerrar preocupações para os países produtores – que devem se engajar nos órgãos internacionais em questionar a aplicação indiscriminada e extraterritorial dessas normativas – já que o mundo necessita produzir tais produtos em abundância e com respeito às normas ambientais e também aos pactos globais do clima.

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